Enquanto isso … na Sala da justiça….. o Ônibus Hacker

27 jul
Busão Hacker no FISL 13

Busão Hacker no FISL 13

Este textinho é um presente para um camarada meu que me pôs em contato com essa experiência massa  do Ônibus Hacker, Pedro Belasco.

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Sempre me espantei com os super-heróis americanos, tinham tantos poderes… e sempre os usavam para que o capitalismo voltasse a normalidade. Na cidade ou no mundo, Homem-Aranha ou Super-Homem, Batman ou Quarteto Fantástico. Todas as forças, armas e poderes para que o acúmulo de mais valia não seja ameaçado por bandidos malvados. Para a que o grande desperdício estadunidense continuasse intocado. Sempre confundiram democracia com o american way, o que além de errado, é feio, bobo e narigudo.

Estava mais que na hora de surgirem novos super-heróis tupiniquins, só que agora digitais, para se juntar aos que já lutam por um mundo justo de fato, nas trincheiras da educação, da luta por terra, por saúde. Por dignidade e distribuição de recursos, mas também contra todas as opressões que grassam o cotidiano: machismo, racismo, homofobia, entre tantas outras…

Mas são heróis diferentes, o uso central de seus superpoderes é dar superpoderes para todo mundo. Fazer com que o cidadão comum se aproprie do conjunto de aparelhos e informações que já o rodeiam e passe a usá-los de forma não escrava.

Os heróis digitais não vivem sem seus objetos, computadores, celulares, painéis de led, roteadores. Estes são o anel de poder do lanterna verde deles, a armadura do Homem de Ferro, a varinha de Harry, sem seus apetrechos são apenas pacatos cidadãos. Carregam no bolso ou nas costas a possibilidade de se comunicar com o mundo de forma diferente. Têm o poder de reconfigurar dados públicos de forma inteligível para as pessoas, de criar rádios e TVs livres, de criar coisas novas a partir de arduíno, de montar aparelhos diversos. De abrir redes e ideias.

Seu poderes são os das redes e das ondas; redes de pessoas e máquinas, ondas eletromagnéticas.

Não sabem se a melhor forma de salvar Gotham City é com Ubuntu, RedHat ou Debian – e isso gera discussões longas e divertidas – mas sabem que não é com Windows e OS.

Certo dia alguns decidiram levar essa vida de caracol mais a sério, a conchinha não seria mais uma mochila, mas sim um ônibus inteiro. Como se diz em Sampa: um busão. Acharam um site de financiamento coletivo, crowdsourcing, e em pouco tempo as ruas e redes do Brasil contavam com uma nova Sala da Justiça, mas esta ambulante, e tentando fazer justiça de fato.

Têm suas manias e línguas estranhas: Interface gráfica é para mugglers, é para noobs, legal mesmo é mexer na tela de comando, no prompt. A língua é truncada, sempre se está entre termos como kernell, VU, apt get, sudo, Tux, Puffy, BSD, TCP, entre inúmeros outros.

Quem são estes novos heróis? Tem de todos tipos, formas, cores e gêneros, homens e mulheres, meninos e meninas, de todo o Brasil

Um jovem padawan ainda, um pequeno gafanhoto, e com o super-poder de imprimir coisas em 3D! De transferir parte do que era o metier e a diferença da grande indústria para a casa de cada um. Perdeu uma peça? Não ligue para a empresa ou fornecedor ou assistência, imprima outra.

Outro herói cria rádios livres com a mesma facilidade com a qual as pessoas normais abrem documentos de word. Um tem o poder de libertar pessoas de dependência de propriedade alheia através de aplicativos multimídia livres. Outro crias redes de compartilhamento aberto em quase tempo nenhum. Uma outra ainda tem o poder criar redes em torno do Busão que o energizam, atraem pessoas para ele e, tão importante quanto, mantém o busão rodando.

Têm também seus arqui-inimigos, os que colocam a cidade e o mundo sempre em risco. O malvado Super Bill Portões e suas janelas do mal, o falecido Malévolo Esteves Trabalhos, que continua escravizando o mundo através de seus fiéis acólitos os Maçãs do Inferno.Além destes dois seres das trevas os inimigos são todos aqueles que querem fechar o mundo e a possibilidade de transformação aberta pelas novas tecnologias. Sejam estes governos, patrões, grande mídia ou qualquer um que queira transformar em propriedade aquilo que pode ser de todos.

A luta só está só iniciando. Mas já dá para saber que o bicho vai pegar mesmo quando os antigos heróis – movimentos e pessoas que querem a transformação deste sistema-mundo gerador de miséria e desigualdade – se apropriarem também deste superpoderes em sua luta. Aguardem, está só começando…

8 Respostas to “Enquanto isso … na Sala da justiça….. o Ônibus Hacker”

  1. maria helena flynn 27/07/2012 às 22:56 #

    gostei muitíssimo destas idéias!
    endosso!
    MH

  2. Capi Etheriel 29/07/2012 às 10:25 #

    Você esqueceu do nosso poder mais divertido: emitir um sinal no mundo a que todos os heróis respondem (alguns respondem TLDR, outros respondem I’m Busy, mas em geral todo mundo responde com pong). Nós temos nossos bat-sinais 😉

  3. Rodrigo 30/07/2012 às 10:07 #

    Desculpe, Guilherme.
    Como você bem sabe, não consigo evitar… Tenho de fazer o meu papel de sujeito chato e espinhudo…
    Não entendi como é que esses nossos novos heróis, de modo diverso dos outros, combatem a acumulação de mais-valia.
    Abraços,
    Rodrigo.

    • pbelasco 31/07/2012 às 12:56 #

      ô Rodrigão …
      Acho que um jeito de combater o monstro, é transversalmente criar alternativas à sua forma de cooptação. A apropriação das formas de fazer é um passo importante nessa briga. Pelo menos é o que eu sinto.

      • Rodrigo 31/07/2012 às 19:41 #

        Sim, Pedro, concordo.
        Deus me livre ser um desses estudantes que acham que o essencial está nas suas noções simplórias de luta de classes e de economia política…
        Mas acho que existe, nessa questão das possibilidades de uso do meio técnico de comunicação, muito… muuuito exagero. Não que eu ache que eles de nada sirvam, ou que, em si mesmos, são perniciosos – Deus me livre, de novo, de ser tido por um nostálgico quebrador de máquinas. Acho que até que esses meios podem ser de alguma importância. Assim mesmo, no condicional: podem. Só que um bom jeito de não se realizar as possibilidades que eles podem ter é partir de um pressuposto que os livra de qualquer desconfiança. Um modismo corrente que eu espero viver o suficiente até conseguir ver morto. (Na década de 90 havia um pessoal empolgadíssimo com o surgimento dos cabeamentos de TV, com a “quebra do monopólio” “Imagina só! O conteúdo constestador que vai haver em uma TV com centenas de canais!” Hoje, convenientemente, ninguém se lembra disso…)
        Uma coisa que pode parecer surpreendente, hoje, é que antes da internet as pessoas já se comunicavam. E de maneira muito sofisticada. Pois bem. E se invertêssemos o sentido mais rotineiro de nosso juízo? Posar de prafrentex diante do camponês medieval (é o tipo que me vem mais facilmente à cabeça, pobre coitado, poucos foram mais avacalhados que ele) é facil. E nos submetêssemos ao exercício contrário: nós, os avançadinhos, a partir do juízo desse faminto (ou melhor, nossos processos comunicativos do ponto de vista dos do passado)? O João-Bom-No-Gadanho, no interior da Peninsula Ibérica do século XIII, bem poderia nos dizer: “Por Santiago Matamoros! Como vocês ganharam!” Mas emendaria logo em seguida: “Valei-me Virgem Maria, como vocês perderam!”
        As possibilidades de uso contestador do meio técnico de comunicação só valem alguma coisa se, antes de ele ser compreendido como aquisição, for também compreendido como derrota – como constituinte dos processos de acumulação de capital, como participante dos processos que turvam a vida social e embotam a compreensão que se pode ter dela.
        Acho que quem quiser contestar a sua época deve evitar ser presuçoso e arrogante como ela. Estar disponível para os seus dilemas é um bom exercício.

        Beijão.

      • pbelasco 17/08/2012 às 23:12 #

        Então Rodrigo,
        Concordo com tudo menos com duas coisas, com o objeto da discussão, que não é exatamente o uso de meios técnicos moderninhos para se comunicar, somente, e com deus.

        É importante ressaltar que a idéia do ônibus não é de fazer festa com os blogs progressistas, nem de alardear aos quatro ventos as benesses da internet na vida cotidiana, mas de atentar para a possibilidade de que qualquer cidadão pode olhar para sua televisão e primeiro pensar: olha, acho que posso descobrir como este aparelho funciona, da mesma maneira que pode cogitar: olha, a televisão é um meio de propagação de idéias que é usada unicamente para me convencer de que a roda do capital tem que girar, e eu faço parte da engrenagem. E o processo para os dois raciocínios é bem parecido.

        É bem mais simples do que parece, e talvez por pura ingenuidade, eu veja algum traço da utópica tomada de consciência do trabalhador nestes processos e julgue importante provocar e instigar a curiosidade de quem se aproxima do ônibus pelo puro prazer de ver uma fagulha acontecer.

        Um abraço!

  4. Rodrigo 20/08/2012 às 12:35 #

    Obrigado, Pedro.
    Talvez agora eu comece a entender o que é o “Ônibus Hacker”. A minha primeira pergunta, sobre como esses heróis combatem a acumulação de capital, era, na verdade, uma pergunta a respeito do que é que faz mesmo esse pessoal – coisa que não está clara no texto.
    Sim, claro que é sempre melhor ter um olhar desencantado sobre as coisas: é mais razoável compreender como opera uma transmissão eletromagnética que descuidar disso e, no fundo, delegar tudo, preguiçosamente, à atuação de um princípio místico. Mas eu não chegaria a apostar que o esclarecimento de um processo técnico, de algum modo, poderia fomentar – ou facilitar – uma desmistificação de processos sociais. Até porque, através da aparente “objetividade” das redes e computadores, através do aparente descompromisso dessas lógicas, movimenta-se a mais irracional, a mais partidária, a mais enlouquecida ideologia.
    E, o que é desconcertante: talvez haja, naquele olhar que não compreende, fora do misticismo, como é que operam as transmissões de dados, uma sabedoria que nós, os técnicos, já não possuimos. E que, a despeito de nosso triunfalismo, é um ponto de partida que faz muita falta.

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